É de conhecimento geral que o direito brasileiro manifesta clara preferência pela contratação de mão de obra por meio de regime de emprego, tradicionalmente é mais visto e mais aceito pela maior dos obreiros, com a impressão de que consiste em um regime mais seguro aos empregados. Deste modo, a alternativa usualmente utilizada é o contrato de trabalho regulado pelo artigo
443 da
CLT, por meio do qual o trabalhador é arregimentado para prestar serviços subordinados, de forma pessoal e continua, mediante o pagamento de salário com periodicidade mensal.
No âmbito da construção civil, além da contratação acima descrita, é comum depararmos com outras formas de contratação, como por exemplo, a contratação por meio de figuras jurídicas da empreitada e da subempreitada, sendo as duas formas mais verificadas no cenário atual.
A empreitada está prevista no
Código Civil, em seus artigos
610 a
626 e visa a contratação dos obreiros para a consecução de uma determinada obra. Neste diapasão, cabe iniciarmos discussão a respeito da responsabilidade do tomador de serviços pelas obrigações trabalhistas decorrentes do contrato firmado entre a empreiteira e seus funcionários.
Perante a legislação trabalhista, apenas torna o responsável o empreiteiro quando do inadimplemento das obrigações trabalhistas decorrentes da contratação, conforme dispõe o Artigo
455 da
CLT.
Art. 455 - Nos contratos de subempreitada responderá o subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro.
Parágrafo único - Ao empreiteiro principal fica ressalvada, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o subempreiteiro e a retenção de importâncias a este devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo.
Até mesmo os Tribunais Regionais do Trabalho vem entendendo que o contrato de empreitada é plenamente possível e plausível.
“EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO/EMPREITADA. A distinção do trabalho prestado de forma autônoma, através de contrato (escrito ou verbal) de empreitada, para aquele prestado de forma subordinada, reside no preenchimento, neste último caso, de todos os pressupostos previstos no art. 3o. Consolidado, pessoalidade, não-eventualidade, subordinação e salário, particularidades que não se presumem, mas que só podem ser extraídas do contexto probatório; bem como na circunstância do prestador de serviços não se revestir da condição de real empreiteiro, não contando com uma organização e estrutura própria, não assumindo o risco do negócio. A terceirização de serviços e a empreitada são conceitos que se entrelaçam e que não são práticas ilegais por si só, contudo, a sua utilização de forma a impedir a formação correta do vínculo empregatício não pode ser prestigiada. A Justiça precisa estar atenta às práticas que desvirtuam a formação do vínculo empregatício, com a contratação de mão de obra sob o manto da empreitada para o desempenho de atividade que é de trato sucessivo e essencial à "tomadora", desonerando-a dos encargos sociais típicos da relação de emprego para baratear a produção, o que se afigura como uma prática ilegal, que não passa pelo crivo do art. 9º consolidado (TRT – 3ª Região, DECISÃO: 21/07/2003, TIPO: RO NÚMERO ÚNICO PROC: RO - 00022-2003-080-03-00 TURMA: Sexta Turma FONTE: DJMG 31/07/2003 - PG: 13).
A principal diferença entre o contrato de empreitada e o contrato de trabalho, consiste na questão da característica hierárquica do empregado em relação ao seu empregador. No contrato de empreitada, a figura do empreiteiro executa seu trabalho para o contratante sem se submeter a nenhum tipo de subordinação, diferente do que é visto no contrato de trabalho. Neste caso, o empreiteiro pratica atos sem subordinação à vontade do dono da obra.
Por outro lado, a jurisprudência do TST atesta que o dono da obra não tem responsabilidade pelo cumprimento das obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, quando não é uma construtora ou incorporadora.
OJ 191 do TST: “Diante a inexistência de previsão legal, o contrato de empreitada entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora”.
São marcantes as diferenças entre o contrato de empreitada e o contrato empregatício. Em primeiro lugar, a distinção quanto ao objeto do pacto: na empreitada, a realização da obra (até sua conclusão), ao passo que, no contrato de emprego, emerge relativa indeterminação no que tange ao resultado do serviço contratado, pois, embora o empregado esteja vinculado a uma função, este recebe distintas orientações ao longo da prestação laboral.
Outra fundamental peculiaridade no contrato de empreitada é a ausência de clausula de infungibilidade do prestador de serviços; vale dizer, pode o prestador dos serviços se fazer substituir no transcorrer da concretização da obra. Na empreitada, portanto, é o empreiteiro quem assume a responsabilidade pela obra e se compromete a concluí-la em determinado prazo.
Diante do cenário acima exposto, importante fazermos breve comentário a respeito da figura jurídica da subempreitada, regulado pelo artigo
455 da
CLT. Neste caso, quem se comprometeu a efetuar certa obra a repassa a alguém para que este a execute parcial ou totalmente; assim procede a empresa construtora de todo um edifício, quando subcontrata a carpintaria ou eletricidade, por exemplo; na autentica subempreitada se desenvolve a atividade pactuada com ordens próprias, iniciativa e autonomia. Nasce daí a subempreitada, que consiste em um contrato derivado, celebrado entre o empreiteiro e outra empresa especializada.
Outro instituto com certa aplicabilidade é a possibilidade de se pactuar a contratação de empregado por prazo determinado, ocorrendo o denominado Contrato por Obra Certa.
A Lei nº
2.959/56 admitiu a contratação de trabalhador por prazo determinado, por obra certa ou serviço certo. Se, entretanto, ele for contratado para prestar serviços em várias obras de uma empresa de construção civil, não estamos mais diante dessa modalidade contratual, mas sim de um contrato normal por prazo indeterminado.
Caso o empregador não disponha da data exata de encerramento dos trabalhos, nem por isso estará descartada a hipótese de um contrato de trabalho por prazo determinado, vez que existe a possibilidade de se tratar de serviços prefixados, que consiste no denominado “Contrato De Trabalho por Obra Certa”.
O Contrato de Obra Certa consiste em um contrato de trabalho como qualquer outro, com subordinação do empregado, tendo como singela particularidade o fato de que a prefixação da data (ou da época) de cessação contratual retira do empregado o direito ao aviso prévio indenizado, à indenização de 40% do FGTS e, em certos casos, o direito às garantias e estabilidades do emprego.
Assim, uma empresa na construção civil poderá realizar a contratação de empregados por meio de contrato por obra certa, mesmo sendo esta sua atividade principal e de caráter permanente, pois a construtora, quando contratada para a realização de uma determinada obra (em que pese ter necessidade de mão de obra permanente), devido a transitoriedade do negócio firmado tem como justificar a predeterminação do prazo de vigência do contrato, condicionada à conclusão dos serviços.
Veja-se esse exemplo ilustrativo, de decisão judicial em que foi afastada a validade desse tipo de contratação, em razão de atividade permanente da empresa contratante.
EMENTA. CONTRATO POR OBRA CERTA E SUAS PRORROGAÇÕES. VALIDADE. 1. O contrato por prazo determinado não foi acatado pelo MM. Juízo "a quo", o qual entendeu que o contrato não preenche os requisitos do art. 443, § 2º, da CLT, já que a recorrente, a efetiva empregadora, pertence ao ramo da construção civil, logo, essa atividade não é temporária ou transitória. Por outro lado, o MM. Juízo "a quo" enfatizou ser inadmissível a ocorrência de sucessivas prorrogações. 2. O contrato individual de trabalho por obra certa deve ser anotado na CTPS do trabalhador pelo construtor. Construtor é o empregador que exerça a atividade em caráter permanente, atuando no ramo da construção civil (art. 1º, Lei n. 2.959/56). Em tese, a atividade da empresa de construção civil é permanente, mas há situações nas quais o serviço prestado é sempre transitório. O fato do construtor tem uma atividade permanente, de forma isolada, em nada eiva de nulidade a adoção do contrato de obra certa no âmbito da construção civil. Por outro lado, o contrato de obra certa não pode ser superior a dois anos, admitindo-se uma única prorrogação (desde que respeitado o período máximo de dois anos) (arts. 445 e451, CLT). 3. Portanto, o fato da reclamada pertencer ao ramo da construção civil, com atividade permanente, não elide a existência do contrato por prazo determinado. Contudo, o que é inadmissível é a seqüência injustificável de prorrogações contratuais. O contrato foi prorrogado quatro vezes (fls. 87/90). Por esse fundamento, mantenho a indeterminação do contrato de trabalho, com a manutenção das verbas rescisórias deferidas, rejeitando-se o apelo da reclamada”. (PROC. TRT/SP nº 20030508732 - Procedimento Sumaríssimo RECORRENTE: MGM CONSTRUTORA LTDA 1º RECORRIDO: JOSÉ TEÓFILO DE SOUZA 2º RECORRIDO: SAINT-GOBAIN QUARTZOLIT LTDA FRANCISCO FERREIRA JORGE NETO JUIZ RELATOR).
A questão gera efeitos práticos relevantes. Quando terminada a obra ou serviço, o empregado contratado por prazo determinado faz jus às férias e ao 13º salário, alusivos ao período trabalhado, bem como o levantamento do FGTS, sem multa. Mas se a Justiça desconsidera a validade do contrato, como no exemplo acima, o tratamento jurídico será o de um empregador normal.
No que concerne acerca de eventuais restrições à rescisão contratual, mesmo que na modalidade de obra certa, temos a esclarecer que, no que concerne as garantias de emprego, nos contratos de prazo determinado, para algumas situações peculiares, como gravidez, acidente de trabalho, dirigente sindical, entre outras, tem-se que a estabilidade tem por finalidade assegurar ao empregado sua permanência no emprego, com vistas ao principio da continuidade da relação empregatícia, a qual, de pronto, não é garantida em tal modalidade de contratação.
De fato, aquele que firmou contrato de prazo determinado, obedecendo ao principio da autonomia da vontade, possui, de antemão, pleno conhecimento do inicio e do término do seu contrato.
Assim, o entendimento jurisprudencial é no sentido de que seria possível ao empregador rescindir o contrato do empregado no prazo estipulado, mesmo que este se enquadrasse nas situações de estabilidades provisórias, já que no contrato determinado não se aplicam tais garantias. É o que se infere nos julgados abaixo:
“ACIDENTE DE TRABALHO – CONTRATO A TERMO. Não há estabilidade provisória decorrente de acidente de trabalho ocorrido durante contrato por prazo determinado, que tem como característica ser resolvido com o término do prazo previamente fixado entre as partes, por incompatibilidade com o instituto da estabilidade provisória, que somente tem sentido para impedir o despedimento naqueles contratos por prazo indeterminado. Apesar de a trabalhadora encontrar-se em gozo de benefício previdenciário em decorrência do acidente de trabalho, essa situação não transforma o contrato a termo em contrato por prazo indeterminado, não se havendo de falar em estabilidade provisória da empregada.” (TST, 2ª Turma, RR - 281400-31.2006.5.12.0051, Relator: Ministro Renato de Lacerda Paiva.)
“ACIDENTE DE TRABALHO - CONTRATO A TERMO - DIREITO À ESTABILIDADE PROVISÓRIA - INEXISTÊNCIA. A estabilidade garantida pela lei visa assegurar ao empregado a sua permanência no emprego, com base no princípio, vigente no Direito do Trabalho, da continuidade da relação de emprego. Desta forma, é evidente que a garantia do emprego, por 12 meses, ao segurado que sofreu acidente de trabalho, prevista no art. 118 da Lei n.º 8.213/91, destina-se, exclusivamente, a evitar, durante este período, a dispensa injusta dos empregados que tenham celebrado contratos por prazo indeterminado. Nos contratos por prazo determinado, o afastamento do acidentado não gera o efeito de mudar o termo final da contratação, já que não tem natureza de continuidade, pois as partes já conhecem a data do término do contrato, inexistindo, assim, o direito à estabilidade.” (TRT-20 - RECORD: 1437200700520008 SE 01437-2007-005-20-00-8, Data de Publicação: DJ/SE de 03/07/2009)
Vale destacar, ainda, que no contrato de trabalho por obra certa existe a possibilidade de inclusão da Cláusula Assecuratória de Rescisão Antecipada, que se dá quando, no contrato por prazo determinado, menciona-se que tanto o empregado quando empregador poderá rescindir o contrato a qualquer tempo, nos moldes do Artigo
481 da
CLT.
No entanto, ao dispensar-se empregado sem justa causa, em casos cujo contrato de obra certa não contenha a cláusula assecuratória, o empregador estará obrigado ao pagamento da indenização correspondente à metade da remuneração a que o empregado teria direito até o término do contrato.
Por fim, vale lembrar, ainda, a possibilidade de contratação de trabalho temporário, nos moldes da Lei nº
6019/74: trata-se de uma modalidade de contratação que envolve a intermediação entre o trabalhador e a empresa tomadora dos serviços por meio de uma empresa de trabalho temporário, que é fornecedora da mão de obra e a responsável pelo pagamento da remuneração e demais direitos trabalhistas.
Esta modalidade de contratação implica a contratação do trabalhador por um prazo de três meses e pode ser utilizada em duas hipóteses: a) substituição de pessoal regular e permanente; b) acréscimo extraordinário de serviços.
Em recente Portaria nº 789, de 02 de junho de 2014, o Ministério do Trabalho e Emprego estabeleceu a possibilidade de prorrogação dessa modalidade contratual, sendo que na hipótese legal de substituição transitória de pessoal regular e permanente, o contrato poderá ser pactuado por mais de três meses com relação a um mesmo empregado, nas seguintes situações:
I – quando ocorrerem circunstâncias, já conhecidas na data da sua celebração, que justifiquem a contratação de trabalhador temporário por período superior a três meses; ou
II – quando houver motivo que justifique a prorrogação de contrato de trabalho temporário, que exceda o prazo total de três meses de duração.
Observadas as condições estabelecidas na referida Portaria, a duração do contrato de trabalho temporário, incluídas as prorrogações, não pode ultrapassar um período total de nove meses.
Na hipótese legal de acréscimo extraordinário de serviços, será permitida prorrogação do contrato de trabalho temporário por até três meses além do prazo previsto no artigo 10 da Lei n◦
6.019/74, desde que perdure o motivo justificador da contratação.
O contrato de trabalho temporário será considerado nulo de pleno direito, nos termos do artigo
9º da
CLT, quando comprovada, pela Inspeção do Trabalho, a inexistência do motivo justificador da contratação nele indicado, sujeitando os infratores às cominações legais correspondentes.
Diante do exposto, espera-se que haja uma maior consciência das empresas que atuam no ramo da construção civil para com seus empregados, uma vez que segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, a construção civil é o ramo que mais apresenta quadros de trabalho escravo nos centros urbanos do país.
E deste modo, cada empresa possa se adequar, permitindo aos empregados uma condição digna e benéfica, respeitando todos os seus direitos decorrentes da relação de emprego, ou da prestação de serviços.