Por que é tão difícil?
Nas primeiras vezes em que eu apresentei o curso "COMO NEGOCIAR E VENDER SERVIÇOS DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA", em 2004, o tópico que tratava das características do produto tomava pouco mais do que uma das oito horas/aula do curso.
Com o tempo (e a experiência decorrente das questões recorrentes levantadas pelos participantes) este tópico foi crescendo em importância e hoje ocupa praticamente metade do curso.
O primeiro pressuposto é o de que os principais erros cometidos pelos profissionais em suas negociações são erros de abordagem. Engenheiros e Arquitetos vendem uma coisa difícil de vender, mas se comportam como se estivessem vendendo ingressos para a final da copa do mundo. A maioria comporta-se, no mercado, como se estivessem vendendo algo que todo mundo quisesse (e soubesse) comprar.
O segundo pressuposto é o de que engenheiros, arquitetos e agrônomos são pessoas inteligentes e que, se tiverem a plena consciência do tamanho do problema saberão encontrar ou tirar o melhor proveito das eventuais técnicas e recursos de vendas (que são apresentadas na outra metade do curso)
Falando nas tais dificuldades... serviços de engenharia, arquitetura e agronomia são, antes de tudo, SERVIÇOS.
E serviços, como qualquer principiante de marketing sabe, precisa ser tratado de uma maneira muito especial, em função de seis características importantes (Intangibilidade, Inseparabilidade, Variabilidade, Improtegibilidade, Inarmazenabilidade e Precificação subjetiva). Já tratamos delas em outros artigos. Aqui vamos um pouco adiante: vamos chamar a atenção para o fato de que, além dessas características, os serviços de engenharia, arquitetura e agronomia ainda apresentam outras quatro, igualmente complicantes:
Primeira: NÃO É UM PRODUTO FINAL. É sempre um insumo incorporado a uma obra, um equipamento, um processo produtivo ou outra forma qualquer de produto final; Ninguém compra um projeto de Engenharia ou de Arquitetura para colocar numa moldura e pendurar numa parede. Ninguém contrata serviços de Engenharia para se divertir ou para obter qualquer forma de satisfação imediata. O serviço de Arquitetura ou de Engenharia é sempre incorporado a um processo em andamento, que vai resultar no produto final, que será outra coisa. Quando o cliente contrata um engenheiro ou um arquiteto, é nessa OUTRA COISA que ele está pensando. E é também, para essa “outra coisa” que o profissional deve apontar, durante a negociação.
Segunda: NÃO É UM PRODUTO DE CONSUMO DE MASSA. Portanto, não pode usufruir os benefícios da imensa quantidade de técnicas e recursos de marketing que existem para produtos de massa; Serviços de Engenharia e Arquitetura são Produtos de Consumo Restrito. Serviços de Engenharia e Arquitetura não são comprados ou consumidos por muitas pessoas, muitas vezes na vida. Por melhor que seja um profissional, por mais satisfeitos que fiquem os seus clientes, é sempre pouco provável que existam compras ou consumos sucessivos. Isso não dispensa a preocupação com a satisfação dos seus clientes (que poderão influenciar a decisão de futuros contratantes) mas, em última análise o profissional sempre terá que conquistar novos clientes, o que, em certa medida, dificulta a estabilidade comercial. Além disso, o fato de o produto não ser “de consumo de massa” torna inútil todos os principais recursos de comunicação com o mercado (mídia aberta, recursos de promoção de vendas, etc) disponíveis para os empresários que trabalham com mercadorias;
Terceira: NÃO É UM PRODUTO FÁCIL DE SER COMPREENDIDO PELO CLIENTE. A maioria dos clientes não sabe comprar serviços de Engenharia e de Arquitetura, reduzindo a avaliação do produto à simples comparação de preços; Serviços de Engenharia e Arquitetura são Produtos com Alto Componente Intelectual Agregado. São, em última análise, CONHECIMENTO ORGANIZADO. Obter, processar e produzir conhecimento depende de um treinamento intelectual que é obtido através de muitos anos de estudos profundos. A maioria das pessoas, cerca de 99,5 % da população (atenção: isto não é um chute. É uma estimativa muito realista!) não faz a menor ideia de como funciona a cabeça de um engenheiro ou de um arquiteto.
Por isso muitos engenheiros e arquitetos reclamam: “o cliente não sabe valorizar o meu trabalho”.
Evidente que não! As pessoas valorizam o que conhecem. Dão sempre mais valor ao conhecimento compartilhado (uma música faz mais sucesso não por ser a mais bem feita ou mais difícil de ser executada. Pelo contrário: quanto mais fácil de ser cantada e executada por qualquer um, mais sucesso ela fará). É preciso dar atenção ao nível de percepção que o cliente tem do produto. No mercado, a coisa não é o que é. É aquilo que é percebido. Desenvolver habilidades de comunicação (falar, ouvir, ler, escrever...) pode ser (e geralmente é) um fator determinante para o sucesso profissional.
Quarta: NÃO É UM PRODUTO QUE PROVOQUE NO CLIENTE NENHUM PRAZER IMEDIATO DE CONSUMO. Os clientes não gostam, não se entusiasmam nem sentem prazer algum na compra desses serviços. Os clientes, via de regra, não gostam da experiência de comprar serviços de Engenharia ou de Arquitetura. Por mais chocante ou desagradável que esta afirmação possa ser, ela é verdadeira. Pergunte a qualquer pessoa que tenha contratado um arquiteto ou um engenheiro.
A experiência de comprar um carro, um eletrodoméstico, uma joia, um apartamento ou uma roupa nova é, geralmente, uma experiência prazerosa. Durante a negociação o cliente está diante da perspectiva de uma satisfação que virá imediatamente após a compra. Mesmo a (dolorosa) experiência de comprar o serviço de um dentista está ligada à perspectiva de um prazer imediato (o alívio de uma dor ou a correção de um problema estético). O processo de compra, para a maioria dos produtos (seja mercadoria ou serviço) está vinculado, direta ou indiretamente, a alguma forma de benefícios e satisfação IMEDIATA para o cliente.
Comprar serviços de Arquitetura ou de Engenharia, no entanto, não está ligado a nenhum prazer imediato. A realização do cliente, a satisfação, os benefícios e, em última análise, o prazer, estão ligados ao fim do processo: a conclusão da obra de construção, o equipamento, o funcionamento de um processo...
Sendo assim, durante a negociação e venda de serviços de Arquitetura e Engenharia, não podemos contar com esse importantíssimo recurso natural das negociações que é a exploração da ansiedade ou desejo do cliente pela obtenção desse prazer imediato.
O resultado do serviço do engenheiro ou do arquiteto só aparece muito tempo depois e, freqüentemente, passa despercebido, pois está “misturado” com a influência de dezenas de outros fatores.
Esta é uma condição para a qual o profissional precisa estar atento, pois é um obstáculo que precisa ser transposto.
Quando está negociando com um arquiteto ou um engenheiro o cliente se sente, de alguma forma, angustiado, exatamente pela falta dessa motivação do resultado imediato. Ele tem a sensação de estar tendo uma “despesa” e não a de estar fazendo um INVESTIMENTO.
É preciso encontrar maneiras de fazer o cliente sentir a perspectiva de resultados. Fazer o cliente perceber que o serviço que está sendo vendido faz parte (decisiva) da construção do resultado pretendido pelo cliente, ainda que isso não seja tão evidente.
Durante a negociação o profissional deve falar menos do serviço que está sendo oferecido e mais (muito mais) do produto final com o qual o cliente está sonhando (e, portanto, está realmente preocupado). O profissional precisa saber fazer estimativas dos benefícios diretos do seu serviço ao produto final. Precisa saber quanto de valor o seu trabalho agrega ao produto final.
Tudo isso, tanto quanto possível, quantificados e associados a valores financeiros.
Produzir (e negociar) serviços de Engenharia e Arquitetura é um bocado mais complicado do que produzir e negociar mercadorias. Sabemos disso. Ou melhor, percebemos isso, a partir das nossas experiências do dia-a-dia profissional. Muitas vezes, no entanto, não conseguimos entender o “porquê”.
Prestar serviços de Engenharia e Arquitetura, além dos conhecimentos técnicos, requer ainda habilidades e conhecimentos de gestão e de mercado, para lidar com todas as dificuldades decorrentes dessas características que acabamos de ver.
É preciso muito mais do que conhecimentos científicos e técnicos para fazer da Engenharia e da Arquitetura um negócio lucrativo e, portanto, economicamente viável.
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